Por - Dacio Borges de Melo (*)
Quem anunciava a chegada do inverno eram as rapa-cuias. Pequenas pererecas de olhos esbugalhados, ágeis no pular e muito simpáticas. Seu cantar parecia o raspar de uma cuia. Daí o nome. Era uma graça, vê-las pulando de parede a parede. Tinha por elas um enorme carinho.
Aos primeiros cantos das rapa-cuias, todos diziam: ó, a chuva tá chegando.
Um dia perguntei pra Mamãe: Como é que ela faz tanta zoada ?
E ela disse: É que elas tão raspando a cuia.
E pra que? - Perguntei, admirado.
É pra guardarem água da chuva.
Eu disse: e é?
É, pra depois, quando a chuva passar, elas ficarem tomando banho de cuia.
E quando a cuia secar? - Perguntei.
Aí ela torna a cantar pra chuva voltar.
E eu ali de olhos arregalados, admirado na minha inocência.
Ainda procurei por um tempo, por entre telhas e paredes a cuia das rapa-cuias. Nunca encontrei nenhuma.
A meninada já se preparava para os primeiros banhos de chuva. Lá em casa havia um bequinho que recebia toda água do telhado e jogava a mesma quintal abaixo. A gente fazia fila pra tomar banho na bica do bequinho.
Mas o bom mesmo era correr pelas ruas, todo mundo saudando a chuva gostosa que chegava.
Todos disputando alguns instantes nas biqueiras das casas vizinhas.
Depois saíamos pulando e gritando de rua em rua feito um bando de doidos.
Depois, passada a chuva, a meninada, batendo queixo, abraçavam a si mesmos como a se protegerem do frio.
E a água a escorrer pela rua, corríamos a fazer açudes. O melhor local pra se fazer os mesmos, era no canto da quinta do Pai Vieira e, mais à frente, diante da casa de seu Benedito, ainda beirando a cerca da quinta.
Fazíamos eu, Divaldo, Danunzio e Antônio dos Reis, enfim, a turma toda, enormes açudes, todos com sangradouro que eram talos de mamão enfiados na barreira do açude pra não acumular água demais.
Ali cada um confeccionava e botava seus barquinhos de papel e ficava empurrando-os pra lá e pra cá. Era uma viagem!
Quando tudo passava, que o sol se abria, passado o frio, íamos aguardar a quebra das barreiras daqueles enormes açudes.
Só os mais velhos faziam isso. Cada um de olho em seus barquinhos.
Rompido o açude todos saiam alegres acompanhando a trajetória de seus barcos.
Aquela enorme enchurrada às vezes ia até a casa de seu João Guerra, às vezes menos, em frente ao curral de seu Benedito.
Acabada a festa, era esperar outra vez, o cantar da Rapa cuias.
(*) Dácio Borges de Melo é florianense, filho do saudoso Mestre Walter. Atualmente Dácio mora em São Luís.
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