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HISTÓRIAS QUE O POVO CONTA

CAÇADORES DE GATOS

Colaboração: Dácio Borges de Melo

Parte I

Nas primeiras chuvas de inverno, meu pai enumerava as goteiras, localizava suas posições e contratava um bom profissional para reajuntar telhas e substituir as que estivessem quebradas.

Tudo isso causado pelas brigas pavorosas e namoros escandalosos da gataria vizinha.
Dácio Melo

Correria no telhado, gritaria e choradeira de felinos pra meninos que iam pra rede com imagens de monstros e assombrações das estórias contadas pela Dindinha. Era um caso muito sério.

Nos cobríamos da cabeça aos pés. Ainda jogávamos uma banda da rede por cima pra nos escudar do medo. De manhã estava todo mundo mijado.

Por tudo isso eu sentia uma certa conivência de nossos pais, quando formávamos patrulhas noturnas de caçadores de gatos.

Certa noite reuniu-se uma turma de corajosos patrulheiros com paus e pedras nas mãos. O inverno se avizinhava e a lua encoberta pelas nuvens deixava a noite um puro breu.

A escuridão e um silêncio profundo nos enchiam de pavor, mas estávamos ali todos juntos, um dando força pro outro. Djalma, Divaldo, Danunzio, Waltinho indo e, às vezes, vinha; e eu pequeno ainda e o Gungadin.

Todos no quintal lá de casa.

Parte II

Silêncio e escuridão. Aqui é acolá ouvia-se o pio e o farfalhar das asas dos morcegos na juçareira ao lado, saboreando os frutos maduros.

De repente, como que saindo do nada, eis que surge do quintal de seu Firmino dois gatos brigando numa gritaria apavorante, percorrendo o muro e vindo em nossa direção. Desceram o muro numa velocidade assombrosa e se engalfinharam debaixo de nossos pés. 

Parte III

Ave Maria!  Foi um pandemônio dos diabos, porque nós, apavorados, voltamos correndo e gritando pra cozinha, um atropelando o outro no maior desespero. Acredito que os gatos também,  assustados com nossa gritaria, tomaram rumo contrário, pro fundo do quintal e num salto voaram por sobre o muro, desaparecendo na escuridão da noite.

Fechada a cancela da cozinha, ficamos ali todos juntos nos refazendo do susto. Respiração ofegante e corações a mil. Em meio ao silêncio só ouvia-se o baticum dos corações. Tum, tum. Tum, tum. Tum ... tum. ..tum. .. Refeito do susto, alguém quebrou o silêncio num misto de raiva e medo e disse : - Gato fidumaegua! Um outro falou! - Gato filho da puta. Ainda outro. - Amanhã ele vai ver, aquele miserave. E emendou: Vamos simbora ! No que foi prontamente atendido. E fomos todos pra rua, com o rabinho entre as pernas.

Depois dessa, nunca mais. Ufa!

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