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PARA O RESGATE DA MEMÓRIA DA CIDADE DE FLORIANO

Pesquisa & Comentários: Nelson Oliveira

Texto: Djalma Silva, o professor e suas memórias

CHUVA! CHUVA!...

O Inverno ia geralmente de dezembro a abril. As chuvas amiudadas ou intermitentes caindo, correndo pelas bicas e biqueiras das casas, encharcando a areia grossa das ruas ou fazendo lama nos terrenos compactos. Nas ruas em declive aconteciam as enxurradas, onde os meninos soltos brincavam. Os vegetais vivificando, estuantes de seiva.

Mas, no entanto, chegava o mês de maio. Os noturnos tinham-se ido. O tempo agora era claro, bonito. Árvores e ervas floridas, alegrando os campos. No firmamento azulado, nuvens leves e brancas como flocos de algodão. No primeiro dia nos tempos recuados de minha infância, as janelas amanheciam enfloradas. Um costume muito bonito, muito agradável, muito gentil, que foi desaparecendo com o passar dos anos. Irrompiam os ventos gerais. Era então chegada a época de empinar papagaio ( pipa ). E de dia os céus se atrelavam de várias cores e tipos.

A temperatura amena, à noite, ia até julho. Chega agosto. E então – era, como disse Veras de Holanda, “ trinta e dois ”:

O sol dardeja e queima.
O sol fuzila.
Num bárbaro calor que as almas aniquila.

Setembro era a mesma coisa. A quentura torrando a vegetação, secando as fontes e pondo modorra nas pessoas e nos animais, mas vinha a chuva dos cajus. As florescências dos cajueiros se transformavam em frutos. E estes logo amadureciam, pintalgando as árvores de amarelo e vermelho. Uma beleza. Nos domingos muita gente e principalmente muito menino iam para os matos buscar cajus e brincar.

A partir de outubro, trovões e relâmpagos, a par de algumas precipitações pluviosas, punham no povo as esperanças de um bom inverno, de fartura, de bem estar. Se, em vez disso, o céu continuasse profundamente azul, isento de nuvens pronunciadoras de chuvas, o vento balançando as copas das árvores, sibilando nos telhados sem forro nas casas, arrepiando a cobertura das palhoças e varrendo o chão, levantando as nuvens de poeira, o povo começava a preocupar-se.

Nos encontros de ruas, na conversa das varandas ou nas portas das casas à noite, a tônica era uma só. O prolongado verão e a expectativa de dificuldades e até de fome.

No silêncio das alcovas as famílias oravam implorando a proteção dos seus santos. Nos subúrbios a gente humilde, em procissão, saía à tardinha para pelos matos com garrafas de água na cabeça rogando a DEUS nos seus cânticos: “ chuva!... chuva!... chuva com abundância! “
...
COMENTÁRIOS EXPLICATIVOS SOBRE O TEXTO

Com Respeito aos papagaios, ou pipas, que eram empinados, o palco era a praça da Igreja – hoje, Sebastião Martins, pelo espaço que possuía uma vasta área, visto que ali só existia mesmo a nossa catedral e se tornava palco dos mais variados tipos de papagaios / pipas e terminava se transformando numa grande festa promovida pelos jovens da época. Dependendo da condição financeira dos empinadores , existiam papagaios / pipas de vários tamanhos e cores, embelezando os céus da cidade. Os instrumentos eram fabricados com pedaços de buriti e papel de seda com tamanho de um metro de altura por um de largura e o seu fabricante era um filho do senhor Celino Miranda, que residia nas proximidades da Igreja Batista, mais precisamente onde está o consultório do doutor Odilon e que atendia pelo apelido “ barata descascada “ em virtude de sua pele muito branca. Como naquele tempo, a criança e o jovem pela educação que recebiam dos pais, tinham ciência dos seus limites e não eram contaminados pela modernidade do mundo de hoje e o papagaio / pipa era, sem dúvida, uma brincadeira sadia que não trazia nenhum prejuízo. Dentre aqueles que tomavam parte da brincadeira, alguns ainda estão no nosso meio, como Chico Pereira e seu irmão Zé Wilson, Fozzi Attem ( in memorian ), Zeca Demes ( residente em Goiás ), Carlos Martins e muitos outros.

O poema intitulado TRINTA E DOIS de autoria de Veras de Holanda, nascido em Caxias, Maranhão, tinha relação com a seca de 32 que assolou o nosso Estado; além de poeta renomado, era professor de vários colégios, inclusive o seu, que era situado na rua Fernando Marques, antes da casa do senhor Abrão Freitas e inspetor de ensino. Veras de Holanda possuía uma vasta cabeleira, como Castro Alves, era casado com a professora de nome Conceição e salvo engano, era irmã da dona Noeme Melo ( in memorian ), mão do doutor Adelmar, Adevan, Adeval, Aldezita, Fátima e outros.

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