Por - Salomão Cury-Rad Oka
É mais que sabido e divulgado que os árabes de Floriano penderam para o comércio assim que chegaram ao Brasil, contribuindo substancialmente para o desenvolvimento mercantil e imobiliário da Colônia Rural de São Pedro de Alcântara. Com sua chegada e trabalho diuturno, começou a existir um “centro comercial” girando em torno da Rua São Pedro, onde ficavam suas lojas e empórios.
Com o dinheiro ganhado nas lucrativas vendas, os mercadores árabes mandavam seus filhos para fora, a fim de completarem seus estudos. Muitos voltaram graduados, formando uma sociedade intelectual que também muito beneficiou Floriano. Porém havia aqueles que se empregavam nas grandes cidades, trabalhando em bancos, hospitais, universidades, repartições públicas federais, etc. Esses florianenses, filhos de árabes, acabaram por levar a fama da Princesa do Sul como terra laboriosa e hospitaleira para as mais diversas partes do Brasil. Assim, quando vinham a casa paterna a passeio, sempre traziam amigos para conhecer a cidade e as mais diversas histórias sobre a comunidade florianense.
Falavam, por exemplo, que a negociação entre dois patrícios era um verdadeiro duelo, pois para o vendedor árabe, importava o lucro máximo, ao passo que para o comprador carcamano, o que importava era o desconto máximo.
Por questão de honra, o preço tinha que ter um mínimo abatimento que fosse, sob pena de suspensão da negociação. Por causa desse impasse, poucos árabes gostavam de vender para patrícios, pois sabiam que as negociações poderiam ser demoradas e que, com certeza, teria que haver desconto.
Havia, pois, um carcamano brincalhão e de humor refinado, filho do Sr. Hagem Mazuad, que se chamava Jorge Mazuad, mas de apelido “Gazzi”.
Retornando para Teresina de uma visita aos pais em Floriano, o Sr. Gazzi Mazuad, que era superintendente do Banco do Brasil na capital, esqueceu na casa paterna sua escova de cabelos de estimação. Dizia que somente ela era capaz de domar-lhe a juba. Ficou triste com o esquecimento, mas sabia que na próxima oportunidade a teria de volta.
Diante da necessidade de se pentear, o Sr. Gazzi foi ao centro de Teresina comprar uma nova escova, para usar provisoriamente. Enquanto procurava local para estacionar, viu, de passagem, uma loja de nome árabe (qualquer coisa do tipo “Casa Jorge Al-Jibálli” ou “Magazine do Lutfy ou do Tufy”) e resolveu dar preferência ao patrício, a despeito da necessidade de ter que negociar.
Ao entrar, viu o típico empório árabe. Diversos cortes e peças de tecidos sobre o balcão e sobre prateleiras de madeira escura, dispostas ao redor da loja; novelos de linha Cléa, Camilla, Carla, Zebra, Aptan e Mercê Crochet; meadas para bordados; brinquedos de diversos tipos, tamanhos e cores; travessas de prata, bronze e inox; e, logicamente, produtos de toalete, que incluíam a escova de cabelo desejada.
No fundo da loja estava um senhor já de meia idade, sentado a uma escrivaninha lendo um jornal escrito em árabe.
Fazendo o balcão estava somente uma jovem, que deveria ter, no máximo dezesseis anos. Estava vestida de maneira muito sóbria e composta, de modo que possuía uma postura muito séria para a idade. Ao ver o novo cliente entrando na loja, abriu um sorriso encantador e foi logo demonstrando interesse em ajudá-lo a comprar. Com seus olhos perspicazes, percebeu que o freguês era endinheirado, mas ignorou-lhe os traços árabes. Sem saber que se tratava de um patrício, ofereceu-lhe então o que tinha de melhor (e mais caro, logicamente). Mas o jovem Gazzi já era gato escaldado, pois possuía muitos anos de balcão na Loja do pai, o Sr. Hagem Mazuad, sacando rapidamente a jogada da menina. Interrompeu-lhe a propaganda educadamente, dizendo que buscava apenas uma escova de cabelo.
Assim, com uma expressão de desapontamento, a moça virou-se para o velho e perguntou em árabe para o freguês “inocente” não entender:
― “Iaba, qadeich furcheia?” ― que significa algo como “papai, quanto custa a escova?”
― “Tnain!” ― respondeu o velho, dizendo em árabe que custava dois cruzeiros.
A moça esboçou o sorriso encantador mais uma vez e disse com toda calma do mundo:
― Para o senhor eu vou fazer um desconto especial: fica por cinco cruzeiros.
Depois do preço dado pela moça, quem riu foi Gazzi, que disse:
― Pois a senhorita me desculpe, mas eu vou querer o preço de seu pai. Ele é muito melhor negociante! Os preços dele são mais acessíveis!
Morta de vergonha da situação, e reconhecendo em Gazzi um patrício esperto, a moça não teve alternativa: vendeu a escova por menos da metade do preço de cinco cruzeiros, perdendo feio na negociação para um árabe-florianense.
É mais que sabido e divulgado que os árabes de Floriano penderam para o comércio assim que chegaram ao Brasil, contribuindo substancialmente para o desenvolvimento mercantil e imobiliário da Colônia Rural de São Pedro de Alcântara. Com sua chegada e trabalho diuturno, começou a existir um “centro comercial” girando em torno da Rua São Pedro, onde ficavam suas lojas e empórios.
Com o dinheiro ganhado nas lucrativas vendas, os mercadores árabes mandavam seus filhos para fora, a fim de completarem seus estudos. Muitos voltaram graduados, formando uma sociedade intelectual que também muito beneficiou Floriano. Porém havia aqueles que se empregavam nas grandes cidades, trabalhando em bancos, hospitais, universidades, repartições públicas federais, etc. Esses florianenses, filhos de árabes, acabaram por levar a fama da Princesa do Sul como terra laboriosa e hospitaleira para as mais diversas partes do Brasil. Assim, quando vinham a casa paterna a passeio, sempre traziam amigos para conhecer a cidade e as mais diversas histórias sobre a comunidade florianense.
Falavam, por exemplo, que a negociação entre dois patrícios era um verdadeiro duelo, pois para o vendedor árabe, importava o lucro máximo, ao passo que para o comprador carcamano, o que importava era o desconto máximo.
Por questão de honra, o preço tinha que ter um mínimo abatimento que fosse, sob pena de suspensão da negociação. Por causa desse impasse, poucos árabes gostavam de vender para patrícios, pois sabiam que as negociações poderiam ser demoradas e que, com certeza, teria que haver desconto.
Havia, pois, um carcamano brincalhão e de humor refinado, filho do Sr. Hagem Mazuad, que se chamava Jorge Mazuad, mas de apelido “Gazzi”.
Retornando para Teresina de uma visita aos pais em Floriano, o Sr. Gazzi Mazuad, que era superintendente do Banco do Brasil na capital, esqueceu na casa paterna sua escova de cabelos de estimação. Dizia que somente ela era capaz de domar-lhe a juba. Ficou triste com o esquecimento, mas sabia que na próxima oportunidade a teria de volta.
Diante da necessidade de se pentear, o Sr. Gazzi foi ao centro de Teresina comprar uma nova escova, para usar provisoriamente. Enquanto procurava local para estacionar, viu, de passagem, uma loja de nome árabe (qualquer coisa do tipo “Casa Jorge Al-Jibálli” ou “Magazine do Lutfy ou do Tufy”) e resolveu dar preferência ao patrício, a despeito da necessidade de ter que negociar.
Ao entrar, viu o típico empório árabe. Diversos cortes e peças de tecidos sobre o balcão e sobre prateleiras de madeira escura, dispostas ao redor da loja; novelos de linha Cléa, Camilla, Carla, Zebra, Aptan e Mercê Crochet; meadas para bordados; brinquedos de diversos tipos, tamanhos e cores; travessas de prata, bronze e inox; e, logicamente, produtos de toalete, que incluíam a escova de cabelo desejada.
No fundo da loja estava um senhor já de meia idade, sentado a uma escrivaninha lendo um jornal escrito em árabe.
Fazendo o balcão estava somente uma jovem, que deveria ter, no máximo dezesseis anos. Estava vestida de maneira muito sóbria e composta, de modo que possuía uma postura muito séria para a idade. Ao ver o novo cliente entrando na loja, abriu um sorriso encantador e foi logo demonstrando interesse em ajudá-lo a comprar. Com seus olhos perspicazes, percebeu que o freguês era endinheirado, mas ignorou-lhe os traços árabes. Sem saber que se tratava de um patrício, ofereceu-lhe então o que tinha de melhor (e mais caro, logicamente). Mas o jovem Gazzi já era gato escaldado, pois possuía muitos anos de balcão na Loja do pai, o Sr. Hagem Mazuad, sacando rapidamente a jogada da menina. Interrompeu-lhe a propaganda educadamente, dizendo que buscava apenas uma escova de cabelo.
Assim, com uma expressão de desapontamento, a moça virou-se para o velho e perguntou em árabe para o freguês “inocente” não entender:
― “Iaba, qadeich furcheia?” ― que significa algo como “papai, quanto custa a escova?”
― “Tnain!” ― respondeu o velho, dizendo em árabe que custava dois cruzeiros.
A moça esboçou o sorriso encantador mais uma vez e disse com toda calma do mundo:
― Para o senhor eu vou fazer um desconto especial: fica por cinco cruzeiros.
Depois do preço dado pela moça, quem riu foi Gazzi, que disse:
― Pois a senhorita me desculpe, mas eu vou querer o preço de seu pai. Ele é muito melhor negociante! Os preços dele são mais acessíveis!
Morta de vergonha da situação, e reconhecendo em Gazzi um patrício esperto, a moça não teve alternativa: vendeu a escova por menos da metade do preço de cinco cruzeiros, perdendo feio na negociação para um árabe-florianense.
2 comentários:
O Okinha, como sempre, arrebenta em suas histórias sobre uma Floriano antiga e cheia de saudades... Mas falar dos carcamanos na atualidade é uma arte, pois os filhos dos carcamanos estão deixando estas histórias maravilhosas e engraçadas irem pro beleléu. Devia haver um centro cultural ou um grupo folclórico de carcamanos aí em Floriano... Adoraria conhecer, quando fosse praí visitar os parentes. Muito bom mesmo o post! Valeu!
Ivo Rocha Santos
Eu conhecia essa história! Não era cheia de floreios, o que, aliás, a embelezou muito, mas é real mesmo! E o cabelo do Gaze era gruli com força! joguei muito baralho e dominó com ele... Senti saudades...
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