EPISÓDIOS DO FOLCLORE ÁRABE FLORIANENSE
SÃO JORGE MODERNO
Por Salomão Cury – Rad Oka
Certa vez, adentrou no empório de Salomão Mazuad, um senhor interessado em adquirir uma imagem de São Jorge. Seu Salomão perguntou-lhe se ele queria um quadro com a estampa do santo ou uma escultura em gesso ou madeira. Diante da indecisão do freguês, foi logo expondo todas as estatuetas e também molduras contendo figuras de diversos santos.
O rapaz estava maravilhado. Eram santos e santas diversos e multicores; madonas em diversos tamanhos e modelos, com e sem o menino Jesus ao colo; anjos de trombetas, de harpas e até de sanfonas e Cristos em diversos momentos importantes.
Diante de tanta santidade o freguês não se conteve e exclamou:
- Mas “ seu Salamão “, o senhor tem tanto santo aqui que “ inté “ parece o céu! Mas eu não “ tô “ vendo meu São Jorge.
Olhando de maneira mais apurada, o sírio percebeu que havia várias imagens de santos diversos, mas nenhuma de São Jorge. Chamou dois funcionários de confiança e os mandou verificar no depósito. Estes funcionários, que se chamavam Irineu e Vieira, já estavam acostumados com as saídas estratégicas do senhor Salomão para esse tipo de “ saia justa “, mas não viam como o patrão poderia contornar a situação sem perder o freguês.
Cabe aqui um breve adendo: para quem não sabe, Salomão Mazuad não permitia a presença de ninguém desacompanhado em seu depósito, pois temia furtos mais que o calote. Assim, certa vez, disse a Vieira que ficasse de olhono “ nego “ Irineu, pois ele o estaria roubando. Minutos depois, nesse mesmo dia, mandou chamar o dedicado Irineu e disse-lhe que prestasse muita atenção em Vieira, que ele não valia nada e o estaria roubando. Assim, Irineu e Vieira, sem saber, só iam juntos ao depósito para um vigiar o outro. E por isso os dois foram juntos ao depósito a fim de procurarem uma imagem de São Jorge. Mas nada encontraram. Só havia imagens de santos com pouca saída, que acabavam virando ponta de estoque. Dentre estas imagens, figuravam várias estatuetas ilustrando de um imponente São Pedro de barbas fechadas e brancas com a chave dos Portões do Céu em punho cerrado e numa postura muito ereta. As estatuetas tinham um tamanho mediano e eram em gesso, mas ricamente decoradas em detalhes dourados e prateados, além das cores costumeiras para os trajes do pescador que foi o primeiro Papa.
Diante da ausência de uma imagemzinha que fosse de São Jorge, chegaram ao ouvido do senhor Salomão, que proseava alegremente com o freguês e lhe disseram que o São Jorge estava em falta. O sírio ainda chegou a esboçar raiva no semblante, mas como de costume, seu pensamento rápido não o abandonava. Perguntou à dupla de funcionários o que é que tinha pendurado no estoque. Responderam-lhe que era um São Pedro de gesso, que não tinha muita saída porque era caro por causa da pintura dourada. O carcamano perguntou-lhes porque havia sido feita encomenda de um produto que não tinha saída no comércio. Vieira esclareceu que a encomenda tinha sido de uma partida de imagens de São Pedro de Alcântara, o Padroeiro de Floriano, mas que o fabricante, por engano, mandara aquele São Pedro da chave do Céu. Ouvindo estas palavras, um estalo se deu na cabeça do imigrante e ele disse aos dois funcionários que trouxessem um exemplar desse São Pedro chique.
Vendo a imagem, o freguês foi logo dizendo:
- “ Seu Salamão “, deve haver algum engano. Esse não é são Jorge. São Jorge é aquele santo vestido de cavaleiro que “ tá “ montado num cavalo derrotando um dragão!Esse aí eu nem sei quem é!
Todavia, o atilamento do senhor Salomão Mazuad era medonho. Chamando o freguês para um canto, disse-lhe baixinho:
“ Gompadre”, “ essa ser “ o melhor artigo “ do “ loja! “ Essa ser “ São Jorge Moderno. Antigamente, todo mundo andava a cavalo. Mas hoje em dia as coisas estão modernas -, apontando para o São Pedro com convicção, continuou a explanação: - “ essa ser “ São Jorge de último modelo. Veio da Europa. Por isso custa o dobro do preço! São Jorge antigo anda “ de “ cavalo, mas São Jorge Moderno anda de automóvel. Olha a chave do carro na mão dele!
E acabou vendendo o São Jorge Moderno para o freguês, que, satisfeito com a compra do artigo de luxo, chamava de matuto quem ousasse dizer que aquele não era São Jorge.
Fonte: jornal Voz de Floriano