CHUVA!
Djalma Silva ( o professor e suas memórias )
O inverno ia geralmente de dezembro a abril. As chuvas amiudadas ou intermitentes caindo, correndo pelas bicas e biqueiras das casas, encharcando a areia grossa das ruas ou fazendo lama nos terrenos compactos. Nas ruas em declive aconteciam as enxurradas, onde os meninos soltos brincavam. Os vegetais vivificados, estuantes de seiva.
Mas chegava o mês de maio. Os noturnos tinham-se ido. O tempo agora era claro. Bonito. Árvores e ervas floridas, alegrando os campos. No firmamento azulado, núvens leves e brancas como flocos de algodão. No primeiro dia nos tempos recuados de minha infância, as janelas amanheciam enfloradas. Um costume muito bonito, muito agradável, muito gentil, que foi desaparecendo com o passar dos anos. Irrompiam os ventos gerais.
Era então a chegada à época de empinar papagaios ( pipa ). E de dia os céus se estrelavam de várias cores e tipos.
A temperatura amena, à noite, ia até julho. Chega agosto e, então, era, como disse Veras de Holanda: "TRINTA E DOIS, o sol dardeja e queima. O sol fuzila. Num bárbaro calor que as almas aniquila."
Setembro era a mesma coisa. A quentura torrando a vegetação, secando as flores e pondo modorra nas pessoas e nos animais. Mas vinha a chuva dos cajús. As florescências dos cajueiros se transformavam em frutos. E estes logo amadureciam, pintalgando as árvores de amarelo e vermelho. Uma beleza. Nos domingos, muita gente e principalmente muitomenino ia para os matos buscar cajús e brincar.
A partir de outubro, trovões e relâmpagos a par de algumas precipitaçõies pluviosas, punham no povo as esperanças de um bom inverno, de fartura, de bem estar.
Se em vez disso o céu continuava profundamente azul, isento de núvens pronunciadoras de chuvas, o vento balançando as copas das árvores, sibilando nos telhados sem forro nas casas, arrepiando a cobertura das palhoças e varrendo o chão, levantando núvens de poeira, o povo começava a preocupar-se.
Nos encontros de ruas, na conversa das varandas ou nas portas das casas à noite, a tônica era uma só. O prolongado verão e a expectativa de dificuldades e até de fome.
No silêncio das alcovas as famílias oravam implorando a proteção dos seus santos. Nos subúrbios a gente humilde, em procissão, saía à tardinha pelos matos com garrafas de água na cabeça rogando a Deus nos seus cânticos:
Chuva! Chuva!. Chuva com abundância!
Notas explicativas sobre o texto
Com respeito aos papagaios, ou pipas, que eram empinados, o palco era a praça da Igreja – hoje, Sebastião Martins, pelo espaço que possuía uma vasta área, visto que ali só existia mesmo a nossa catedral e se tornava palco dos mais variados tipos de papagaios / pipas e terminava se transformando numa grande festa promovida pelos jovens da época.
Dependendo da condição financeira dos empinadores , existiam papagaios / pipas de vários tamanhos e cores, embelezando os céus da cidade. Os instrumentos eram fabricados com pedaços de buriti e papel de seda com tamanho de um metro de altura por um de largura e o seu fabricante era um filho do senhor Celino Miranda, que residia nas proximidades da Igreja Batista, mais precisamente onde está o consultório do doutor Odilon e que atendia pelo apelido “ barata descascada “ em virtude de sua pele muito branca.
Como naquele tempo, a criança e o jovem pela educação que recebiam dos pais, tinham ciência dos seus limites e não eram contaminados pela modernidade do mundo de hoje e o papagaio / pipa era, sem dúvida, uma brincadeira sadia que não trazia nenhum prejuízo. Dentre aqueles que tomavam parte da brincadeira, alguns ainda estão no nosso meio, como Chico Pereira e seu irmão Zé Wilson, Fozzi Attem ( in memorian ), Zeca Demes ( residente em Goiás ), Carlos Martins e muitos outros.
O poema intitulado TRINTA E DOIS de autoria de Veras de Holanda, nascido em Caxias, Maranhão, tinha relação com a seca de 32 que assolou o nosso Estado; além de poeta renomado, era professor de vários colégios, inclusive o seu, que era situado na rua Fernando Marques, antes da casa do senhor Abrão Freitas e inspetor de ensino.
Veras de Holanda possuía uma vasta cabeleira, como Castro Alves, era casado com a professora de nome Conceição e salvo engano, era irmã da dona Noeme Melo ( in memorian ), mão do doutor Adelmar, Adevan, Adeval, Aldezita, Fátima e outros.
Fonte: Nelson Oliveira
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