6/23/2007

FLORIANO - PAIXAO QUE SE NÃO LIMITA!

Por: Raimundo Floriano

Não existe balsense mais florianense da gema do que eu. Desde o meu nascimento, a palavra Floriano soou-me como melodia vinda do céu. E não era para menos. Seu Rosa Ribeiro, meu saudoso pai, homenageando sua terra natal, nomeara-me Raimundo Floriano.

Desde cedo, aprendi a orgulhar-me desse nome. Meus irmãos mais velhos, que estudavam em Floriano, vinham de férias falando nos mágicos encantos da cidade. Assim, eu ansiava pela chegada de minha vez de conhecê-la.

No dia 5 de fevereiro de 1949, aos 12 anos de idade, embarquei no motor Pedro Ivo, rumo ao estudo, ao progresso e ao desconhecido. Logo em Uruçuí, onde o Rio Balsas desemboca no Parnaíba, aquele mar de água. E nele, uma amostra do que seria o porvir: o vapor Brasil – para mim, um navio –, sob o comando do florianense Seu Antônio Anísio, rebocando 3 imensas barcas, fazia manobras para aportar. No dia 8, desembarquei na rampa de Floriano.

Aguardava-me um estivador chapeado previamente contratado por minha tia Maria Isaura, moradora à Rua Fernando Marques, 698, para onde seguimos, ele com minha mala e o saco da rede, e eu com o meu assombro diante de tanta coisa nova que se descortinava ante meus olhos.

Bem na rampa, uma frota de jumentos, pertencente à Dona Inês Angelim, carregada de barricas d’água para fornecimento à população, subia íngreme ladeira em ziguezague, sabedoria asinina que logo seria transmitida a este matuto, grande admirador dos jegues. Mais adiante, a rua calçada, o meio-fio, a arborização, a casa de Seu Tiago Roque, a Praça da Matriz, a Avenida, os sobrados dos carcamanos, bicicleta com um menino enriba dela, as carroças de Seu Salomão Mazuad, o Riacho do Gato e o Riacho da Onça passando por dentro da metrópole.

Daí pra frente, novos impactos: o Ginásio Santa Teresinha, a Escola Normal Regional, o Cine Natal e outros primores que se me apresentavam, tais como luz elétrica, sorvete, picolé, gelo em barra, gibi, e carro, muito carro, os caminhões de Seu Arudá Bucar, ônibus e jipes.
Se eu pudesse determinar qual a Oitava Maravilha do Mundo, não titubearia em decretar que seria o serviço de alto-falantes, mais conhecido como amplificadora. Em Floriano, havia duas. A Amplificadora Florianense, “a voz líder e potente da cidade” nas palavras do seu locutor, o Defala Attem, e a Amplificadora do Chico Reis, “a voz do comércio, a maior”, como apregoava o locutor Almir Reis, filho do dono.

Cinema era pago, picolé era pago, sorvete era pago, gibi era pago, mas a amplificadora era diversão acessível a qualquer bolso, mesmo o mais desapercebido. Bastava ter ouvidos e atenção. Uma saía do ar e, ato contínuo, a outra emendava, presenteando-nos com os mais belos sucessos musicais. Essas duas amplificadoras foram as responsáveis pelo amor que tomei pela Música Popular Brasileira, pela memória musical que hoje me proporciona meio de ocupar meu ocioso tempo de aposentado, fazendo-me, pelo Orkut, um internauta intensamente procurado por aficionados do mundo inteiro, que me consideram o mais completo, atualizado e atento colecionador, no âmbito da Música Militar, do Carnaval Antigo e do Forró.

Indeléveis na minha memória são os prefixos das duas emissoras. A Amplificadora Florianense iniciava e encerrava seus trabalhos com o dobrado Batista de Melo, de Antônio Manoel do Espírito Santo. A Amplificadora do Chico Reis, com o dobrado Antônio José de Almeida, de Horácio Casado. Quando comecei a ganhar dinheiro, muito tempo depois disso, e pude comprar meu primeiro som, cuidei logo de amealhar essas relíquias. Pena que, hoje, ao completar 71, já não encontre pessoas daquela época para trocarmos idéias, tirarmos dúvidas, contarmos reminiscências, matarmos saudades, ouvirmos os sons que marcaram nossas adolescências. E fico telefonando a esmo, na vã esperança de lograr conexão com algum interlocutor contemporâneo, unzinho sequer. Sossega, coração!

Morei lá apenas um ano. Em 1950, fui estudar em Teresina. Mas minha bem-querença, renitente que é, recusou-se a partir.

Agora, no seu 110º Aniversário, não titubeio ao afirmar, sem medo de erro:
Em 1949, Floriano, a minha querida Xará, era assim!

15 comentários:

Anônimo disse...

Um dos mais belos textos de amor por uma cidade que eu já li.
Raimundo Floriano é um sujeito apaixonado por essa terra e foi brilhante no seu artigo.
Que informar que este texto também está publicado no Jornal da Besta Fubana, que pode ser acessado neste endereço:
www.bagaco.com.br
Luiz Berto - Recife-PE

Anônimo disse...

FLORIANO, Raimundo (Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva) – n. 03-07-1936-Balsas (MA). Filho de Emigdio Rosa e Silva, o Rosa Ribeiro, e Maria de Albuquerque e Silva, a Maria Bezerra. Contador, Trombonista, Oficial da Reserva ao Exército. Serviu no 25º Batalhão de Caçadores, Teresina (PI), na Escola de Sargento das Armas, Três Corações (MG), no 12º Regimento de Infantaria, Belo Horizonte (MG), e no Batalhão de Polícia do Exército de Brasília, BPEB, do qual é fundador. Deixou o serviço ativo militar para ingressar no quadro de servidores da Câmara dos Deputados, mediante aprovação em concurso público de âmbito nacional. Qualifica-se como Amanuense, Cinesíforo, Alectoromaquista, Melômano, Rapsodo, Revascularizado, Almocreve, Diascevasta, Fescenino, Cruciverbista, Matinador, Parafrasta, Calemburista, Abencerragem, Toma-largura, Filatelista, Lusófono, Decifrador e Mestre de Banda da Capital Federal. Especializado em MPB da Velha Guarda, Dobrados, Carnaval e Forró. Cronista em vários jornais e revistas do Brasil. Bibliografia: “Regras de Pontuação e Sinais de Revisão” (1977), “O Acordo PDS - PTB” (1983) e “Do Jumento ao Parlamento” (2003).

Anônimo disse...

Isso que é paixão!!!
Adorei saber de onde vem o nome desse escritor meu amigo! Conheci Floriano, mas só de passagem. Achei a cidade bem grande e desenvolvida, mais do que imaginava antes de viajar para o Piauí.

Agamenon Pedrosa Ribeiro da Costa disse...

Caro Raimundo Floriano,

foi com imensa satisfação que li este seu apaixonado testemunho sobre a nossa querida cidade de Floriano de 1949.

Impressionaram-me as suas lembranças vivas e repletas de detalhes - marca registrada da paixão.

Curioso, para mim, Raimundo Floriano, foi verificar que, vinte anos depois de você aportar em Floriano, eu estava fazendo a sua viagem invertida: em 1969, saí de Floriano e fui estudar em Balsas, no famoso Educandário Coelho Neto - o Internato do Velho Joca.

Satisfação em conhecê-lo, Raimundo Floriano.

Grande abraço.

Anônimo disse...

Caríssimo primo Raimundo, acabo de ler o seu e-mail sobre Floriano e tenho a grata satisfação de dizer que estou muito emocionado. Não tenho, como você, Floriano no nome, mas a tenho no coração. Assim como você, sou um balsense que adora Floriano. A festa dos 110 anos da chegada dos "carcamanos" vai ser ótima, só não estarei presente porque, na mesma época, será a formatura em Medicina do meu filho Adelmar. Se um dia der certo, podemos nos encontrar na Princesa do Sul e, possivelmente, reunir pessoas para falar do passado. O Floriano Clube, embora decadente, ainda existe, e o Comércio Esporte Clube, parece-me que em outubro, completará 50 anos. O meu querido tio e padrinho Abilio Neiva está com 91 anos, mas com uma boa memória e sabe de tudo, pois lá chegou em 1927, vindo de Nova Iorque. Conheço bem uma pessoa que tem muita coisa sobre Floriano, inclusive na festa do centenário publicou um livro. É conhecido como Teodorinho.

Anônimo disse...

Meu caro amigo Raimundo FLORIANO

É um imenso prazer, uma gratificação imensurável, que toma conta de mim, todas as vezes que leio um texto seu. Tenho verdadeiro fascínio pelas histórias das cidades, pelos acontecimentos, pelo comportamento puro das pessoas. Queria muito ter vivido naquela época, e se fosse espírita acreditaria que sou um ser reencarnado. Encanto-me com o romantismo impregnado nas histórias. Sou admiradora do comportamento das pessoas da epoca de Floriano-1949 , por isso acredito meu amigo que você não faz idéia do quanto eu valorizo um texto seu. Sem sombra de dúvida se morássemos mais perto eu seria ouvinte constante de todas as histórias do seu passado. Morro de inveja quando minha mãe conta que os homens faziam serenatas para as moças, com músicas românticas que até hoje ela canta quando peço... E o namoro? Meu Deus... quanto romantismo... quanto bem querer! E as rezas?? as devoções... Considere-se meu amigo um ser privilegiado! E muito obrigada por partilhar suas histórias comigo! Muito obrigada mesmo!
Um forte abraço!

Anônimo disse...

Raimundo Floriano, nome perfeito e bem colocado. Pelas suas palavras que exprime um verdadeiro sentimento e conhecimento da Terra que amamos muito, nota-se que és um grande historiador, meus parabéns. É um grande prazer em saber que és um amante da música romântica, os anos 60 alí nos cabarés do lageiro, ouvía-se muitas músicas, que hoje permanecem vivas no coração de colecionadores como você, ouví muitas, degustando um bom Rum Montilla com coca-cola. Sou filho de Floriano, meu pai foi um grande alfaiate chamado de Vicente Cangurí.

Anônimo disse...

O texto escrito por Raimundo Floriano traduz de forma cristalina o sentimento que todos os florianenses, aqui nascidos ou não, sentem por esta cidade. O sonho de menino, de ir para o novo, descobrir as novas coisas da vida, é por ele descrito de forma exemplar. Nós ficamos transbordando de alegria, quando declarações como estas são feitas à nossa cidade. Ela levou-me às lágrimas, especialmente neste momento em que buscamos resgatar a cidade que ele, como nós, amamos. Neste próximo mês de julho, partindo de uma idéia brilhante do Cristovão Augusto e Teodoro Sobral, estaremos, nos dias 5, 6, 7 e 8, comemorando os 110 anos de nossa cidade e que, para que não fosse apenas mais um aniversário de Floriano, decidiram chamá-lo de 10º ano do centenário. Encontra-se na página da Florianonet, toda a programação e gostariamos que todos vocês e especialmente ele, o Raimundo Floriano, viessem participar conosco desta festividade, onde tentaremos resgatar os momentos felizes, as boas coisas que aconteciam na Floriano de outrora.

Anônimo disse...

Oi, Raimundo, gostei muito desta crônica. Quem a lê, começa a conhecer um pouco da sua história, e com isso sente orgulho de ser seu amigo virtual. Gostaria de ter esse dom de escrever, porque aqui no interior da Minas temos histórias lindas também. Parabéns. Quando puder, me envie seu livro.

Anônimo disse...

Raimundo Floriano é escritor de prosa elegante e saborosa e também um obstinado compilador de relevantes registros da memória secular de nossa gente. Espirituoso cronista de Balsas, e também apimentado narrador de ‘causos’ urbanos do Planalto Central, Raimundo é concertista de muitos instrumentos, tocando-os todos com a habilidade e o ecletismo do virtuose que é. Hábil manipulador das palavras, ele é possuidor de uma destreza literária ímpar que lhe permite, por exemplo, transformar a narração do que seria uma prosaica – mas constrangedora - consulta médico-proctológica em engraçadíssimo relato de uma hilária aventura androplasmática. Para a recorrente indagação sobre se há vida inteligente no orkut, Raimundo é a reposta inconteste de que sim, até mesmo nesse anárquico mundo virtual, onde grassa certa indigência intelectual, a boa verve inventiva e o melhor talento criativo também aqui se fazem presentes, através de artistas notáveis como ele.

Anônimo disse...

Raimundo Floriano,
Deixei para falar sobre o seu texto, no dia do seu aniversário. Na realidade esperei também porque precisava de tempo, que andava muito escasso, para lhe dizer que adorei!! Acho que foi o que de melhor, mais bonito e mais rico de tudo o que já li, escrito por você. Além de ser um texto bem-humorado, conta sobre uma época importante na vida econômico-social do país, conta do encantamento com o "moderno", que é relativizado para um contexto de estado pobre e distante, mas que tem seu dinamismo próprio: a tropa de jegues que abastecia a cidade de água, sua bagagem, que incluía uma rede, o carregador de malas, o movimento da cidade, mas acima de tudo o papel das "amplificadoras", que se constituíam em elementos de divulgação da cultura regional, principalmente através da música, das notícias e também das relações entre as pessoas. Lembra-se dos programas em que as pessoas ofereciam músicas (até hoje existem nas emissoras de rádio mais populares). Era um meio de divulgação muito democrático, não era? Às vezes, falo para algumas pessoas sobre isso que foi muito importante para mim também, em Teresina. Eu ficava esperando os horários da amplificadora que tinha ali na beira do rio e que a "característica" era a música Barril de Chope. Ali também se ouvia a Ave Maria e, de alguma maneira era feito o contato com música erudita.
Raimundo, meus parabéns pelo seu texto, que bem pode servir para análise sociológica, antropológica e mesmo econômica de uma fase da nossa História.
Você bem poderia continuar a explorar esse veio.

Anônimo disse...

Achei uma beleza o texto do Raimundo Floriano. Realmente são reminiscências belíssimas e muito significativas no contexto da modernidade. Além disso, a figura dele é muito interessante: parece saída de uma peça de Ariano Suassuna ou de um romance de Jorge Amado, autenticamente nordestina.

Anônimo disse...

bom seria se o dr. adelmar neiva amasse a medicina como diz amar esta cidade, certamente seria um profissional mais coerente e comprometido com o julgamento de hipócrates que, aliás ele deixou de cumprir há muito tempo.Se assim fosse, certamente muitos outros florianenses teriam motivos prá comemorar com tanta alegria o aniversário da cidade.

Anônimo disse...

Planejava esta mensagem de agradecimento pelo presente do livro "CELECINO se não estamos sós..., quando terminasse a leitura. Demoraria mais uns dois dias. Acabo porém de ler seu testemunho de amor pela Colônia - a Floriano de hoje - no jornal Folha do Maranhão Do Sul e me apercebi que apenas 3 anos nos separaram de convivência naquele rincão do Piauí. Algumas coincidências: também estudei 1 ano (Ginásio Santa Terezinha do Prof. Sobral Neto; senti o impacto de uma cidade maior que a nossa; achei o rio Parnaíba tenebroso, invadindo a rampa e indo quase à Mesa de Renda; curti os picolés servidos pelo Sr. Honorato e Tio Mundico (era tio de papai) no bar de Seu Bento Leão; fui a programas de calouros no Cine Natal, comandados pelo Defala; dancei vesperais no Floriano Club; fui à Igreja da Guia; morei na Fernando Drumond, que cruzava a Fernando Marques na esquina da casa de Seu Xicó e do Sr. Juiz, de quem não me lembro do nome; joguei futebol no campo do Comércio, o antigo, não o de hoje; admirei, quase embasbacado e com ciúmes, a torre prateada da Matriz; e, por fim, caro amigo, o serviço de alto falante da Praça do Mercado que, como você já me disse, era extensão do Cine Natal, me deixou marcas profundas como lembranças de uma namoradinha, ouvindo a música do Pixinguinha, acomodado na carroceria do caminhão do Olegário (ou do Caetano?) que me levava de volta a Balsas. Considerando "Floriano, paixão que se não limita" reconheço o balsense mais florianense da gema...
Aluizio

Anônimo disse...

Absolutamente original e emocionante o texto do Raimundo Floriano. Para ti e para pessoas amantes de suas origens, também coloquei nomes que homenageiam nossa amada cidade, a francesa Floriane Gaudichard Mota de Souza,minha filha e o baiano Florian Correa campos Mota de Souza,meu filho, ambos como você, portam um nome que dei e que terão orgulho por toda a vida!
Boa caminhada.
alberico@metalmindobrasil.com

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